Bebê Desconforto
O ano mal começou e já passamos por duas tragédias como Brumadinho e o Ninho do Urubu. Dois capítulos de uma história de negligência que se repete ano após ano. Vidas ceifadas, histórias encerradas e tristeza sem fim, tudo por que alguém pensou que não ia acontecer. Uma vistoria aqui, um conserto ali não fariam diferença, já que Deus protege, afinal é brasileiro.
Mas, não estou aqui para falar desses dois eventos. Quero falar de nós. De mim, de você, de nossos filhos, sobrinhos, netos, alunos e pacientes.
Chama a atenção o número de bebês vítimas de acidentes porque caíram do bebê conforto ou da cama dos pais. Estas tragédias também se repetem ano após ano. Felizmente, muitos destes pequenos não ficam gravemente feridos. Seu sofrimento se restringe a aquele que a dor e o medo podem causar. Entretanto, alguns destes bebês podem ficar com sequelas neurológicas graves e até morrer.
Então, pergunto: por que bebês conforto e cadeirinhas de automóvel têm cinto de segurança? Por que existe legislação definindo até que idade e tamanho devemos transportar as crianças em determinado dispositivo sempre no banco de trás? Por que os berços têm grades? Porque é assim que as crianças não se machucam, não morrem. É comum ouvir a frase: “é que ele está numa fase que não pára quieto”. Sim, claro, ele tem 9 meses, 18 meses, dois anos, é bom que não pare quieto. Ele não sabe que pode fraturar a coluna cervical e ficar quadriplégico caso “se jogue“da cama box. Eu já vi absurdos como um lindo forro decorando o bebê conforto, pena que o lindo forro fica sobre o cinto de segurança.
Estas situações fazem-me lembrar de outra clássica do verão: “Pedrinho nasceu dia 05 de janeiro, então, como a casa estava alugada em Tramandaí para o dia 01 de fevereiro e Pedrinho precisava interagir com a família, partiu litoral. Uma beleza. Pedrinho vai sacolejando no engarrafamento da Freeway por 4 horas, a casa é barulhenta, cada um dos 8 primos quer dar colo e uma provinha do sorvete, afinal, está um calorão. Não sei por que, mas Pedrinho chora o tempo todo, não quer mais mamar no seio de sua mãe que está com cheirinho de protetor solar, então toma um leitinho feito com água da torneira, fervida, claro. No quinto dia, Pedrinho tem febre. Não sei por quê?!
São nossos Brumadinhos e Ninhos do Urubu! Somos negligentes dentro de nossas casas, com nossas crianças. Claro que isso não redime a culpa das autoridades e responsáveis por grandes empreendimentos e instituições, mas precisamos acordar do sonho do mundo encantado onde nada de mal acontece e assumir nossa responsabilidade como indivíduos. As grandes e pequenas tragédias, digo grandes ou pequenas conforme o número de vítimas, pois não tem filho morto que doa mais ou menos, são os sintomas de uma sociedade doente. Sociedade imediatista, que tem pressa mas que não sabe nem onde nem como está indo. Enquanto não descobrimos nossa cura, fica a dica:
– Bebê conforto SEMPRE com cinto de segurança. Quando fora do carro, no chão.
– Assentos de automóvel idem.
– Bebês não podem ficar sozinhos em camas sem grades.
– Bebês não “precisam”ir para a praia.
Para conferir a recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria sobre prevenção de acidentes, confiram neste endereço: http://www.sbp.com.br/especiais/pediatria-para- familias/prevencao-de-acidentes
Aline Friedrichs de Souza – Pediatra e Gastroenterologista Pediátrica